ESTUDOS PARA O TEATRO.




ESTUDOS PARA O TEATRO.

Análise Interpessoal. (Da poética da leitura a intertextualidade)

"na ressonância, ouvimos o poema, na repercussão nós o falamos, pois é nosso. A repercussão opera uma revirada do ser. Parece que o ser do poeta é o nosso ser. (...) por sua novidade, uma imagem poética abala toda a atividade Lingüística. A imagem poética nos coloca diante da origem do ser falante. (Poética do Espaço, Gaston Bachelard)."

Tentarei elucidar aqui a "Análise Interpessoal" enquanto um procedimento de abordagem do texto dentro do processo "Poesia em Cena". Trata-se do que podemos chamar de uma "Poética da Leitura": Da mesma forma que o poema vem a sua existência através de "um estado poético" ou "condição poética" e portanto nasce da subjetividade do poeta que assume um "eu poético" como interlocutor, digamos, de sua fala. A "Análise Interpessoal" nasce da subjetividade do leitor, que por seu lado também experimenta um "estado poético" ao ler o poema.
A análise é subjetiva e objetiva ao mesmo tempo (Fernando Pessoa utiliza-se do termo subjetividade objetiva e/ou objetividade subjetiva em seus poemas), subjetiva porque é um "Eu" que lê, e portanto interpreta a sua maneira numa primeira instância. Objetiva porque o texto é o "objeto de estudo", e como tal procura-se extrair dele o máximo de significado a partir da sua decomposição, levando em consideração todos os aspectos possíveis (coerentes ou não) que se possa abordar no próprio texto, também numa primeira instância. Depois ainda há todo o processo de pesquisa a partir da intertextualidade (intersubjetividade), isto é a abordagem de outros textos que possam ampliar a nossa compreensão do "texto em questão", estes textos podem ser oriundos da crítica literária, textos filosóficos em geral, outros poemas, biografias, fatos históricos, imagens, experiências pessoais, etc.
Considerando que o "texto" é uma das matrizes do espetáculo, o objetivo é o levantamento de um material pré-expressivo que será utilizado no processo de construção da "Performance", e conseqüentemente o levantamento da "Persona" que será encarnada pelo Performer, sendo a análise interpessoal a primeira etapa, a que chamaremos "Penetração no texto".
A segunda etapa chamaremos de "Interpretação do texto", onde incluiremos o treinamento psicofísico (que deve ser responsável pela partitura corporal e vocal do Performer), a dramaturgia da cena, a construção da "mise en scène", incluindo-se aí todos os elementos que serão somados e incluídos (figurino, cenário, iluminação, etc.). Nesta etapa pode haver a necessidade da desconstrução do texto de acordo com o contexto que ele possa ser inserido, e mesmo como uma forma de confrontação e subversão do texto.
A terceira etapa diz respeito a apresentação da Performance para o público, onde se procura atingir o que chamaremos de "apropriação do texto", neste ponto o texto escrito se transformou em ação verbal-orgânica, e não pode ser dissociado tanto das ações físicas, quanto das relações estabelecidas pela "mise en scène",   portanto se tornando performação. Nesta fase o que há é a reconstrução do texto, pois aqui somamos todo o material pré-expressivo coletado durante o processo de construção da Performance.
A partir daí a Performance pode até ser diferente a cada apresentação, mas sempre haverá uma partitura básica que o Performer poderá se apoiar, pois o texto se tornou para ele suas próprias palavras, ou mais ainda "sua própria fala em cena" que pode ser alterada conforme a sua relação com o público e com o contexto do espetáculo, abrindo sempre possibilidades para improvisação, mas sem nunca perder o foco e a profundidade proposta pela performance.
A análise nunca se esgota, pois é sempre possível retornar ao texto e descobrir novas conexões, novos sentidos que não foram percebidos antes, a desconstrução do texto também pode gerar novos sentidos, novas imagens. A manipulação do texto é livre, e quanto mais domínio o Performer ter sobre o mesmo mais ele poderá intervir, criando inclusive imagens inusitadas, operando portanto, no âmbito da "collage"(como era entendida pelos surrealistas).
Devemos levar em consideração ainda que na Performance trabalhamos muitas vezes com diversos textos diferentes, que podem ser inclusive conflitantes, pois "a  utilização da collage, na performance reforça a busca da utilização de uma linguagem gerativa ao invés de uma linguagem normativa.(...) "Isso tanto ao nível do verbal quanto ao nível imagético." (...) "Na medida em que ocorre a ruptura desse discurso (normativo), através da collage, que trabalha com o fragmento, entra-se num outro discurso, que tende a ser gerativo (no sentido da livre-associação)". (1)
"O processo de collage, na performance, reforça também a importância do colador (no caso o encenador), que passa a ser o elemento preponderante do processo" (2).

(1) - Performance como linguagem, Renato Cohen. Ed. Perspectiva. pág. 64.
(2) - Idem.



Comentários

  1. achei bem intenso e complexo ao mesmo tempo, bem escrito apesar de um pouco longo

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